A pandemia foi um duro golpe para o setor aéreo, que, só no segundo semestre de 2020, deve “queimar” US$ 77 bilhões (cerca de R$ 423 bilhões na cotação atual) do caixa.
Segundo a Associação Internacional de Transportes Aéreos, Iata na sigla em inglês, as aéreas não conseguiram reduzir os custos na mesma velocidade em que as receitas caíram.
A entidade tem mais de 290 companhias aéreas associadas, que representam 82% do tráfego aéreo mundial.
No Brasil, a situação não é diferente. Em setembro, o número de voos se encontrava 60% menor em comparação com o do mesmo mês no ano passado e houve uma série de demissões no setor.
Oeste conversou com o diretor-geral da Iata no Brasil, Dany Oliveira, sobre os desafios neste momento de pandemia.
1) A pandemia pode ser considerada uma “pedra no caminho” na retomada da economia brasileira. Como o setor aéreo tem passado pela crise?
A retomada da demanda de passageiros depende de como vai evoluir a economia daqui para a frente, do ritmo de relaxamento das medidas de bloqueio/quarentena nos diferentes países bem como da recuperação da confiança dos viajantes. Os mercados domésticos devem se recuperar primeiro, seguidos por voos intrarregionais e, de forma gradual e mais lenta, pelos voos intercontinentais de longo curso.
Olhando todas as regiões do planeta, estimamos que o tráfego aéreo global de passageiros retornará aos níveis anteriores à covid-19 somente em 2024. O Brasil poderá atingir os níveis de 2019 já em 2021.
Para este ano, a redução da receita no setor aéreo brasileiro ficará em torno de US$ 10,83 bilhões — uma queda de 57% no comparativo ano a ano. Dessa maneira, o impacto ampliado na economia brasileira deve ser de um encolhimento de US$ 6,64 bilhões no PIB e mais de 318 mil empregos em risco.
2) Que porcentagem da frota brasileira está operando? E no auge da pandemia?
No auge da pandemia, em abril, o número de voos no Brasil estava 91,4% abaixo do observado no mesmo período em 2019. Em setembro, o número de voos se encontrava 60% menor em comparação com o do mesmo mês no ano passado.
3) Já é possível sentir algum tipo de melhora no fluxo de passageiros?
Em comparação com outros países, o mercado doméstico brasileiro de aviação, apesar de apresentar indicadores negativos em relação ao desempenho de 2019, tem se destacado positivamente na retomada da atividade
De acordo com dados da Anac [Agência Nacional de Aviação Civil], a demanda doméstica em agosto de 2020 foi cinco vezes superior à observada em abril deste ano enquanto a demanda internacional cresceu três vezes. Embora a demanda, em agosto, ainda represente um número inferior se comparado com o mesmo período em 2019, notamos crescimento constante e gradual nos últimos quatro meses, reforçando o diagnóstico de que há uma retomada estável e significativa.
Globalmente, a retomada da demanda de passageiros acontece de forma lenta, principalmente nos mercados internacionais, que, em agosto de 2020, registraram contração de 88,3% quando comparada com o mesmo mês do ano passado.
4) O setor aéreo de passageiros está muito ligado ao turismo. A retomada lenta desse setor preocupa?
Segundo dados do World Travel & Tourism Council (WTTC), o turismo contribuiu com US$ 8,3 trilhões para a economia global no ano passado. No Brasil, essa conta está em US$ 74 bilhões, o equivalente a 3,6% do PIB.
O modal aéreo é fundamental para a cadeia do turismo e, diante deste cenário sem precedentes, a urgência em restaurar a conectividade aérea, tão necessária para a recuperação econômica, precisa de colaboração eficaz entre as principais partes envolvidas em nosso setor, como os governos e toda a indústria.
5) Como o senhor vê a importância de apoio do governo para as empresas aéreas? O crédito disponibilizado pelo BNDES é suficiente?
O apoio governamental deve ir além da situação inicial de emergência. Tais medidas precisam ser acompanhadas de outras ações, como o pacote financeiro do BNDES, em condições mais favoráveis de mercado, para rapidamente ajudar a irrigar o capital de giro das companhias aéreas. Sem apoio, sairemos da crise de forma mais lenta e dolorosa.
6) Hoje já se encoraja mais as pessoas a viajar ou ainda são recomendadas apenas viagens essenciais?
A segurança sempre foi prioridade número 1 da aviação. Somos a forma mais segura de transporte porque trabalhamos juntos como um setor e com governos na implementação de padrões globais. O risco de um passageiro contrair covid-19 a bordo é muito baixo. Estudos internacionais apontam 1 caso a cada 27 milhões de viajantes. Além disso, a grande maioria dos casos estudados ocorreu antes que o uso de cobertura facial/máscara a bordo se generalizasse.
Viajar em uma aeronave sentado próximo a outros passageiros é muito mais seguro do que a maioria dos outros ambientes fechados. Isso porque os sistemas de fluxo de ar da aeronave, os filtros de partículas de ar de alta eficiência (HEPA), a barreira natural do encosto do assento, o fluxo descendente de ar e as altas taxas de renovação de ar reduzem com eficiência o risco de transmissão de doenças a bordo…