O Ministério Público Federal abriu uma ação judicial contra a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). Acusa o órgão de violar normas de segurança na concessão de licenças para que novos pilotos operem voos comerciais no país. De acordo com a denúncia, os avaliadores destacados para aplicar os exames nem sempre possuem o domínio teórico e prático do tipo de avião a ser pilotado. Em português claro: "Não estão habilitado" para o exercÃcio da função.
Chama-se Ailton Benedito de Souza o procurador da República que move a ação. Datada de 29 de janeiro, a petição foi protocolada na última quinta-feira (6) na 2ª Vara Federal de Goiânia. O interesse do procurador pelo tema foi despertado por uma revelação da repórter Tahiane Stochero. Anexada ao processo, a notícia é de 10 de dezembro de 2012. Conta que um inspector da Anac habilitado para operar aviões da Boeing foi destacado pela agência para avaliar dois novos pilotos de Airbus A-320 da empresa Avianca.
A avaliação dos pilotos ocorreria no centro de treinamentos da Airbus, em Miami, nos Estados Unidos. O inspetor indicado pela Anac recusou-se a realizar o serviço. Alegou que a prática de convocar profissionais sem o necessário conhecimento técnico para operar determinado equipamento coloca em risco a aviação. Em nome da segurança, preferiu refugar o trabalho.
Submetido à notícia, o procurador Ailton de Souza abriu um inquérito. Remeteu à Anac um pedido de explicações. No texto, o doutor perguntou se era verdade que a agência destacava examinadores para avaliar pilotos em aeronaves sobre as quais não têm domínio teórico e prático. Em sua resposta (ofício 98/2013/DIR-P), a Anac admitiu a prática. Alegou que o procedimento não traz riscos à segurança aeronáutica. E informou que não dispõe de pessoal com habilitação correspondente a todos os aviões em operação no Brasil.
A despeito dos indÃcios em contrário, a Anac sustentou na resposta à Procuradoria que todos os seus regulamentos seguem os padrões estabelecidos pela Organização da Aviação Civil Internacional (OACI). No exercÃcio de suas atribuições, o procurador Ailton de Souza foi procurar. E achou evidências de que as alegações da Anac não fazem nexo.
A própria OACI recomenda que a avaliação dos pilotos seja feita por examinadores habilitados. Eles devem ter qualificação técnica no mínimo igual à dos pilotos que irão avaliar. Logo, concluiu o procurador, é necessário que "inspetores e examinadores detenham domínio teórico e prático sobre o particular tipo de aeronave" a ser pilotada.
O doutor Ailton de Souza debruçou-se também sobre as "recomendações de segurança de voo" editadas pelo Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa). Encontrou dois documentos que contradizem o lero-lero da Anac. Ambos foram elaborados em 2005.
Num, o Cenipa proibiu "os voos de "avaliação de perÃcia" de novos pilotos feitos por inspetores de aviação civil que não sejam habilitados no equipamento a ser checado e não tenham participado de cursos de reciclagem. Noutro, determinou à Anac que realizasse um programa de capacitação dos inspetores nas diversas aeronaves, de modo a dispor de pessoal qualificado para a realização segura dos voos de avaliação.
A Anac opera com duas categorias de avaliadores de pilotos: há os "˜inspac"™, inspetores de aviação civil, e os "˜examinadores credenciado"™. Os "˜inspac"™ são servidores públicos "”71 civis e 56 militares, cedidos pela Aeronáutica. Os "˜credenciado"™ são civis registrados na Anac pelas próprias companhias aéreas, cuja área de atuação é mais limitada. Avaliam, por exemplo, pilotos de táxi-aéreo.
Munido das informações colecionadas no inquérito, o procurador Ailton de Souza concluiu: a exigência de inquestionável domínio técnico dos avaliadores sobre o tipo de avião a ser pilotado pelos avaliados está presente tanto nas normas internacionais de aviação quanto nas recomendações de segurança expedidas pelo órgão que zela pela segurança dos voos no Brasil. Nas palavras do procurador, são regras necessárias "para evitar perdas de vidas e de material decorrentes de acidentes aeronáuticos."
O procurador realçou o óbvio num trecho da ação: ""¦deve existir correlação entre o objeto do exame e as respectivas qualificações e habilitações de examinandos e examinadores. Noutras palavras, os examinadores também devem, eles próprios, ter domínio teórico e prático pertinente à …